Cresce número de alunos da rede pública do Pará que conquistam vagas no ensino superior

Educação de Qualidade

07.02.2017

Dias e noites de estudos, com poucas horas de sono e contato limitado com familiares e amigos. Maratonas e mais maratonas de exercícios em casa, na escola, isso sem contar nos dias de preocupação com toda a pressão de passar no vestibular. “Será que vou conseguir?”. Esse era o questionamento de Yasmin, Weveni e Thainá, alunas da rede pública de ensino, que conhecem muito bem essa rotina e conseguiram se superar para alcançar o sonho de ingressar em uma instituição de ensino superior em 2017.

No interior e na capital, os alunos das escolas públicas estaduais têm conquistado excelentes resultados, tanto pelo desempenho e esforço pessoal, quanto pela dedicação de professores e diretores em mantê-los confiantes em seus objetivos.

Em São João de Pirabas, município da região do Salgado localizado a quase 200 quilômetros de Belém, mora a estudante Yasmin Sousa, 17. Logo ela deverá se mudar para Marabá, no sudeste do estado, onde dará início ao curso de Medicina.

Articulada e sorridente, a jovem se tornou um exemplo na Escola Estadual Francisco da Silva. Ela visita as salas com os alunos que ainda farão o vestibular e o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para falar sobre a sua experiência na preparação para os processos seletivos e, principalmente, para mostrar que todos têm as mesmas possibilidades que ela teve para alcançar essa meta.

Yasmin foi aprovada em Medicina na Universidade do Estado do Pará (campus de Marabá) e em Direito pela Universidade Federal do Pará (campus de Belém). Fazer Medicina é o seu sonho desde a 8ª série. Já o vestibular para o curso de Direito foi só uma maneira de provar para si mesma que era capaz de passar em outra área igualmente concorrida. Sua rotina incluía maratonas de estudos em casa, na escola e em um cursinho preparatório em Capanema, município distante cerca de 50 quilômetros de Pirabas.

“Eu estudei muito todos os dias. Deixei de sair com amigos e de fazer várias coisas só para focar no meu objetivo e hoje estou vendo a realização de um sonho. É muito legal comemorar com a minha família, amigos e os meus professores. Eu fiz questão de ir até a minha escola para abraçar todo mundo e agradecer. Eles foram fundamentais, não só pelas aulas, mas por todo carinho e apoio durante esse processo”, diz a nova acadêmica.

Snhasminaa Batt-Chevva, 39, a “dona Yasmina” - mãe de Yasmin - tem ascendência russa e uma força sem limites quando se trata de apoiar a filha em sua jornada. Ela é a única taxista mulher da cidade e se inspirou em Yasmin para voltar a estudar, terminando o Ensino Médio na Escola Francisco da Silva. E este ano conseguiu entrar para uma faculdade de Pedagogia.

“É um orgulho sem tamanho para nós ver a nossa filha tão feliz. Ela me inspira. Agora nós temos outro desafio porque ela vai se mudar para longe, mas daremos todo apoio necessário”, destaca a mãe.

A diretoria e os professores da escola Escola Francisco da Silva acompanham permanentemente os alunos que estão em preparação para o Enem e vestibulares. Em 2015, foram quatro aprovados e este ano, oito. De acordo com a diretora Marta Cristina Araújo, a dedicação dos docentes e o interesse dos alunos são fatores fundamentais para este resultado. “Temos a nossa preparação normal para o Enem no terceiro ano, mas os professores estão sempre abertos para receber as dúvidas dos alunos e dar aquela força extra quando necessário”, ressalta.

Essa dedicação pode ser vista no trabalho da professora de Física e de Matemática, Adriana Viera. Ela foi responsável por melhorar o desempenho de Yasmin nessas duas disciplinas. Além de acompanhar os trabalhos em sala de aula, Adriana aconselha os alunos sobre suas escolhas e a importância de crescerem além da escola.

Eu fiz parte de uma equipe de professores contratados pelo Estado para reforçar o ensino, principalmente em áreas de maior dificuldade, como Química, Física e Matemática. Nestas duas últimas nós conseguimos melhorar o desempenho dos alunos com muita dedicação e agora começamos a colher os resultados. Além do nosso papel no ensino da disciplina, é importante também motivar e aconselhar esses jovens para que eles consigam perceber que podem se desenvolver muito mais do que imaginam, independente de classe social ou de onde eles moram”, argumenta a professora.

Resultados

Os números da Universidade do Estado do Pará (Uepa) mostram que o desempenho dos alunos da rede estadual alcançou expressivos resultados este ano. Do total de 3.695 alunos aprovados pela instituição, mais de 60% vieram do ensino público: foram 68,76% no Processo Seletivo (Prosel) e 54,21% no Prise Subprograma XVII

– 3ª Etapa.

Na Unidade Especializada Astério de Campos, 13 alunos conseguiram vagas no Curso de Licenciatura em Letras – Libras (Língua Brasileira de Sinais). Na Escola Dom Pedro I, no bairro de Val de Cans, mais de 20 estudantes garantiram vaga no ensino superior, um deles no curso de Medicina.

“Desde 2013 nós trabalhamos com uma política de acessibilidade e cotas dos alunos da rede pública para Uepa, porém mesmo antes disso já vemos notando um crescimento do percentual de ingresso desses alunos à universidade. Isto é resultado de um conjunto de ações não apenas da Uepa como também da Secretaria de Estado de Educação (Seduc), por meio da preparação intensiva destes estudantes para os processos seletivos”, afirma Juarez Quaresma, reitor da Uepa.

Capital

Em Belém, os aprovados também ressaltam a importância dos professores e o apoio da escola em suas histórias de sucesso. Weveni Ferreira, 17 anos, foi uma das 20 aprovadas pela Escola Dom Pedro I. Ela mora próximo ao canal São Joaquim em uma casa simples, onde vive com os pais e o irmão. A caloura diz que mergulhou de cabeça nos estudos ao iniciar o terceiro ano, quando decidiu que queria entrar na universidade. Ela acordava cedo, passava a manhã em aula. Às vezes mal tinha tempo de almoçar quando chegava em casa e já saia para o cursinho. Voltava de noite, para retomar a rotina de estudos até bem tarde, e na manhã seguinte começava todo o ciclo novamente.

“Às vezes eu achava que estava perdendo um ano da minha vida. Pois todos os meus amigos saiam para se divertir, enquanto eu ficava enfiada em casa ou na sala de aula. Acho que tinha medo de estar perdendo tempo por não acreditar que fosse conseguir passar de cara. Mesmo assim eu não desistia”, conta Weveni.

Dias depois do resultado que consagrou o seu primeiro lugar no curso de Zootecnia na Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) e também a aprovação no curso de Enfermagem da Uepa, Weveni ainda comemora com os familiares. “É muito bom ver todo mundo reconhecendo o meu esforço, vindo me parabenizar, e principalmente ver meus pais tão felizes”, diz ela.

Para Joseane Figueiredo, diretora de Ensino Médio da Seduc, que também atua em parceria com os polos do Pro Paz em aulas preparatórias para o Enem, as ações e o planejamento são feitos conforme uma série de análises dos municípios e regiões que mais precisam fortalecer suas ações nessa modalidade de ensino. “Temos investido cada vez mais na formação de professores para estudar o método das bancas das universidades. Além disso, temos programas como ‘Aprender Mais’, que é um reforço escolar nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática”, afirma.

Aluna de Belém fez 980 pontos na redação do Enem Thainá Lobato, 17, é outro exemplo de dedicação. A aluna da Escola Estadual de Ensino Médio Albanízia de Oliveira Lima, conquistou 980 pontos na redação do Enem e foi aprovada nos cursos de Medicina Veterinária, no SISU, e Letras, na Uepa. “Abri mão de muitas coisas importantes, entre elas a minha vida social. Estudava 14 horas por dia, inclusive de madrugada. Todo esse esforço foi válido. Agora é pensar no futuro, realizar os meus sonhos e dos meus pais”, diz a jovem.

A mãe de Thainá, Ana Carla Lobato, fala que desde pequena a filha tinha o hábito da leitura. “Desde muito cedo ela gostava de ler. Procurava leituras de gibis e revistas”, frisa.

Para a nova universitária, além do esforço próprio, outro fator foi preponderante para o bom resultado: o apoio escolar. “O corpo docente teve papel fundamental nesse resultado. Os professores nunca desistiram. Sempre nos preparam para o melhor resultado”, afirma.

“A Escola Albaniza Oliveira mantém projetos que incentivam o hábito da leitura. Exercita os debates sobre assuntos da filosofia e sociologia, sempre moldando os argumentos dos alunos”, reitera a professora de Redação, Sue Anne Freitas.


Texto:Diego Andrade

Fotos:Rodolfo Oliveira e Márcio Ferreira / Ag. Pará