Egresso da rede estadual da Paraíba é aprovado em Medicina no vestibular indígena da Universidade de Brasília (UnB)

Paraíba

31.10.2022

O município de Baía da Traição, no Litoral paraibano, é uma das cidades do Brasil com a maior população declarada indígena. Os descendentes dos povos originários representam mais de 57% dos moradores do município. E no meio das aldeias e das famílias que preservam os costumes dos povos potiguaras e tabajaras, está Filipe Galdino, ou simplesmente Maraniru Potiguara, que é o seu nome indígena. Aos 17 anos, Maraniru acaba de ser aprovado em Medicina no vestibular indígena da Universidade de Brasília (UnB), após uma jornada de preparação e conhecimento que teve como base a Rede Estadual de Ensino da Paraíba e o Desafio Redação Nota Mil.

“Quando eu estava no terceiro ano do Ensino Médio, veio a pandemia e a necessidade de me preparar para o Enem. Foi aí que eu conheci o Desafio Nota Mil, um projeto incrível que me motivou a desenvolver minha escrita. Desde então, segui participando do projeto e estudando em casa. No meu primeiro Enem, que foi o de 2020, alcancei os 960 pontos na redação e eu atribuo muito isso a esse projeto. Infelizmente minha média geral não era suficiente para a Medicina, mas ainda consegui alguns outros cursos como Enfermagem e Direito. Fiquei feliz, mas reconheci que não era o que eu queria ainda e segui”, revela Maraniru.

Escolas Indígenas - Maraniru estudou toda a sua vida em escolas públicas estaduais, e completou o Ensino Médio na Escola Estadual Indígena de Ensino Fundamental e Médio Mathias Freire, no município de Baía da Traição. O Estado da Paraíba conta com 11 Escolas Estaduais Indígenas, que ofertam a Educação Básica de forma integrada aos costumes indígenas.

Trajetória - O caminho traçado pelo estudante até a aprovação não foi fácil. Maraniru precisou dividir o tempo dos estudos com a produção de bolos caseiros, que eram vendidos para ajudar nas contas de casa. O esforço empregado por ele acabou gerando frutos, e no ano em que mais se dedicou aos bolos e aos livros, a aprovação no curso dos sonhos acabou acontecendo.

“No dia-a-dia em casa, morando com dois sobrinhos e minha mãe, percebi a necessidade de ajudar financeiramente. Foi aí que veio a ideia dos bolos. Com algumas semanas de prática e aprendizado, fui aperfeiçoando até que recebi algumas encomendas e daí em diante continuei fazendo e estudando. Não é algo fácil, porque demanda tempo e cansa demais. Mas, eu sempre procurei estabelecer um equilíbrio entre cuidar do presente e cuidar do meu futuro. Neste ano, em 2022, chegou o vestibular indígena da UnB e eu me inscrevi. Foram apenas 2 vagas.  Fiquei extremamente feliz e realizado, porque essa caminhada é muito difícil, cheia de incertezas, pressões, comparação, mas eu perseverei e chegou a minha hora”, disse.

Vestibular Indígena - A Universidade de Brasília (UnB), considerando o Acordo de Cooperação Técnica com a Fundação Nacional do Índio (Funai), realiza, todos os anos, o Vestibular Indígena,, destinado a selecionar candidatos indígenas para o ingresso em cursos de graduação oferecidos pela instituição no segundo semestre. Em 2022, foram oferecidas 81 vagas no total, distribuídas nos campi Darcy Ribeiro (Asa Norte), Ceilândia e Planaltina.

Desafio Nota Mil - Criado no mês de março de 2020, o Desafio visa incentivar a produção de redações e o desenvolvimento dos estudantes da Rede Estadual. Mais de 12 mil alunos dos Ensinos Fundamental e Médio participaram do Desafio entre 2020 e 2021. O Desafio funciona da seguinte forma: toda semana, no domingo, é divulgado o tema da redação e os estudantes têm até a quarta-feira para redigir o texto e disponibilizarem para as escolas enviarem para os corretores. Após a correção, a lista com as 10 melhores notas é divulgada na segunda-feira seguinte.

O sonho da Medicina - Para Maraniru, chegou a hora de retribuir o esforço e dedicação dos familiares e dos povos indígenas da Baía da Traição. O estudante revela que escolheu a Medicina justamente para ajudar as pessoas que mais precisam. “O sonho pela medicina veio quando eu percebi o quanto meu povo precisava de um médico. Sempre me senti constrangido e incomodado ao ver algum parente precisar de uma simples informação e eu não poder ajudar porque não tenho o conhecimento necessário. Então, isso me motivou a buscar a medicina por esse propósito: ajudar”, revela o estudante.