Professor desenvolve óculos de realidade virtual e transforma aulas em escola estadual de Sete Lagoas (MG)

Práticas da escola

13.09.2017

A criatividade, a perspicácia e o entusiasmo daqueles que se dedicam, todos os dias, a ensinar e a transmitir conhecimento fez, mais uma vez, a diferença na educação pública. Utilizando moldes de óculos, papelão, imã, lentes bifocais, tesoura e cola de bastão, o vice-diretor e professor de Geografia, Washington Eloi Francisco, transformou as aulas na Escola Estadual Ruth Brandão de Azeredo, em Sete Lagoas. “A ideia foi utilizar as novas tecnologias, os celulares, por exemplo, para tornar a aprendizagem mais atrativa, dinâmica e prazerosa”, comenta Washington, que, inspirado no Google Cardboard, desenvolveu óculos de realidade virtual juntamente com os estudantes do 3º ano do Ensino Médio.

A proposta de aliar os recursos tecnológicos e aproveitar seus potenciais para o ensino em sala de aula surgiu em 2016, durante a roda de conversa “O Uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) na Escola”, realizada pela Superintendência Regional de Ensino (SRE) de Sete Lagoas, durante o Encontro Regional da Juventude. “Alunos, professores e gestores de escolas da região discutiam os desafios atuais na educação, os prós e contras do mundo digital, o uso do celular e sua relação com o cotidiano escolar e, sobretudo, sua interferência na aprendizagem dos alunos”, explica o vice-diretor.

Decidido a demonstrar, na prática, como a tecnologia e seus recursos podem constituir-se como ferramentas pedagógicas para melhorar o ambiente escolar e o desempenho dos educandos, Washington Eloi Francisco iniciou diversas pesquisas sobre a temática. “Precisava de algo mais cativante para os jovens. Comecei a imaginar como poderia usar o celular em sala de aula, pensei em passar trabalhos por meio das redes sociais, solicitar que fizessem pesquisas pelo aparelho telefônico. Tentei ir por um caminho prático”, afirma.

Segundo o professor, após visualizar, na internet, uma propaganda de celular que era vendido acompanhado de óculos de realidade virtual, descobriu que a Google possuía um projeto, o Cardboard, e havia disponibilizado gratuitamente os moldes para a montagem do equipamento.  “Baixei o modelo no site, comprei as lentes e demais materiais necessários, pesquisei aplicativos disponíveis, montei e testei os óculos”, explica. Confira aqui o vídeo que ensina o passo a passo para montar o acessório de realidade virtual.

Para Washington, é preciso desenvolver uma didática diferente de ensinar. “Tudo se torna válido desde que os devidos cuidados sejam tomados para evitar os excessos comuns a qualquer novidade. Talvez um dos maiores entraves deve-se ao fato de muitos professores ainda não se sentirem totalmente preparados para esta realidade cada vez mais presente no contexto educacional. No entanto, com o projeto consegui que eles usassem o celular sem precisar acessar as redes sociais, mostrei um caminho legal para aprenderem”, ressalta.

Experiência compartilhada

Após testar os óculos, o docente decidiu que todo processo, desde a construção até a experiência da realidade virtual, seria realizado de maneira compartilhada entre os estudantes. “Imprimimos os moldes e cada um trouxe seu próprio papelão. Eles se juntaram em grupos de seis integrantes e receberam uma ficha de relatório juntamente com uma lista de aplicativos que permitem a vivência da realidade virtual. Então, puderam customizar seus acessórios da maneira que desejassem e, após baixarem os softwares, curtirem a experiência”, detalha Washington Eloi Francisco. No total, o vice-diretor comprou, com recursos próprios, 15 pares de lentes.

O professor conta que um dos primeiros aplicativos utilizados em sala de aula foi o Google Street View, recurso do Google Maps e Google Earth lançado em 2007 que, com sua vista panorâmica de 360° na horizontal e 290° na vertical, proporciona aos usuários a sensação de estar caminhando por ruas e avenidas de diversos países. “Se na aula de Geografia comentamos sobre as grandes metrópoles, como Paris, Nova Iorque, Tóquio, São Paulo e suas construções, nada mais produtivo e interessante do que sentir que você está nessas cidades”, diz, acrescentando que os jovens visitaram a Times Square, em Nova Iorque, o Coliseu, em Roma, a Torre Eiffel, na capital francesa, além da Lagoa Paulina, ponto turístico de Sete Lagoas.

Rodrigo Pereira da Silva, estudante do 3º ano do Ensino Médio, aprovou a intenção. “Achei muito legal a iniciativa do professor. É fácil de construir e possibilita o uso em diferentes disciplinas, além de servir de entretenimento em casa, com familiares, e nos momentos com os amigos”, afirma. Após as atividades os discentes produziram relatórios contando sobre o aprendizado com a experiência em sala de aula.

Além de passearem por várias cidades, os alunos ultrapassaram a atmosfera terrestre. “Caminhamos pela lua e suas crateras, vimos o planeta terra, o sol e, a cada passeio, o aplicativo apresentava dados sobre o sistema solar”, conta a estudante Kamila Ester Pinheiro acrescentando que, por meio de outros aplicativos, conheceram seres marítimos em uma viagem ao fundo do mar e, também, fizeram uma caminhada jurássica. “É muito interessante, pois entramos em um mundo diferente”, conclui.

Desenvolvido com 70 alunos, Washington Elói Francisco explica que o aparato pode ir além da Geografia e ser utilizado para o aprendizado de outras disciplinas. “Nessa experiência, eles se aproximaram do Inglês, pois os aplicativos estão todos neste idioma. Aprenderam sobre Física, quando discutimos ótica e o funcionamento das lentes biconvexas, que duplicam as imagens e unem nossa visão para vermos apenas uma figura. Sem falar que há aplicativos sobre Biologia, História, Educação Física, entre outros”, diz.

A iniciativa surpreendeu a educanda Juliana Almeida. “A princípio eu pensei que seria mais uma ideia do professor para colocar a gente para trabalhar. Mas, no decorrer do projeto, percebi que era algo muito interessante e divertido, que ele queria utilizar a tecnologia, algo que gostamos muito, para o nosso aprendizado e para melhorar as aulas”, comenta.  

Expansão

Vencido o desafio de aliar a tecnologia ao ensino, o professor conta que o objetivo é expandir e fazer com que outros alunos vivenciem a experiência dos óculos de realidade virtual. “Os objetos ficaram para uso comum de todos. Os primeiros estudantes estão me ajudando a refazer o projeto para os demais docentes e discentes”, afirma. A escola conta com 420 alunos e a ideia é aplicar nas turmas dos três anos do Ensino Médio.

Para a estudante Kamila Ester, é fundamental que esse método seja constante nas salas de aulas. “Alguns professores, às vezes, reclamam do uso dos celulares, mas, se forem aproveitados de maneira criativa, é possível aprender. A aula fica chata não por causa de quem ensina, mas pelo método utilizado. É preciso pensar em maneiras eficazes e que envolvam os alunos”, diz.

Transformando a relação professor e estudante, modificando a maneira de ensinar e aprender, o professor afirma que o projeto atingiu o seu propósito. “Fiquei muito satisfeito, pois eles compraram a minha ideia, nos aproximamos ainda mais. Os alunos reclamam que falta criatividade na educação e essas ferramentas são fundamentais para atraí-los e transformar o olhar deles para o ensino, para proporcionar aulas legais e torná-los receptivos, principalmente, às teorias”, frisa Washington.

A experiência também animou os demais educadores. “Eles já estão contribuindo com outras ideias, como um projeto que aproveitará as potencialidades da fotografia”, conclui o vice-diretor. Segundo ele, o intenção é contar a história da fotografia, como a imagem é formada, estimular o olhar e a sensibilidade fotográfica e, ao final, promover um concurso e uma exposição com as fotos realizadas pelos estudantes por meio de suas máquinas digitais.

Por William Campos Viegas (ACS/SEEMG)